sexta-feira, 8 de abril de 2011

Extra! Extra! Salário de jornalista parece de jornaleiro


Republico, abaixo, um texto meu de 2007. Infelizmente, permanece atual. Para fechar a semana do Dia do Jornalista.


Quarto Poder, símbolo da liberdade de informação, fiscalizador dos poderes públicos e privados. Profissionais que têm acesso a qualquer pessoa no top 10 das listas de ricos, famosos e poderosos. Formadores e deformadores da opinião pública. Esta é a imagem idealizada que o senso comum tem dos jornalistas, cheia de glamour. Mas a realidade da estúpida maioria dos trabalhadores de televisões, jornais, rádios e revistas não chega nem perto desse mundo da Fantasia.

Pra quem não é da área, vou trocar em miúdos usando o exemplo de dois dos jornalistas mais importantes do mundo: Superman e Homem-Aranha. Na redação do Planeta Diário, provavelmente a mais famosa da ficção pop, há aquele glamour. Claro que há a sede pelo furo, pela notícia em primeira mão, mas Louis Lane e Clark Kent sempre conseguem um prazo extra, verba para matérias investigativas e independência para trabalhar – em dupla! Mais: moram bem, estão sempre elegantemente vestidos, podem pegar táxi à vontade e nunca reclamam de maus salários. A folga é tanta que Superman sempre consegue um tempinho pra dar uma escapada e salvar o mundo dentro do horário de trabalho.

O oposto disso é o ambiente no Clarim Diário, muito mais próximo da chamada “vida real”. Peter Parker se lasca, dá tudo de si pra conseguir as melhores fotos do Homem-Aranha (afinal, ninguém sabe que pra ele é fácil, né?), entrega material pra lá de exclusivo e o que recebe em troca? Baforadas de charuto, mau humor do editor J. J. Jameson e não mais de vinte dólares pelas imagens.

Saindo do mundo dos quadrinhos e voltando à terra de todos os santos, nossa realidade é seguinte. O piso salarial de jornalistas e radialistas é menor que de motoristas de ônibus, operários qualificados da construção civil, pedreiros e até dos ganhos de alguns bóias-frias.

Não acreditou? No jornal Tribuna da Bahia há quem ganhe R$ 681. Os salários do Correio da Bahia começam em R$ 1.000 e no jornal A Tarde, que luxo, R$ 1.320,28. Já o piso para radialistas é de R$ 750. (nota da blogueira - os valores de 2007 pra cá não mudaram muito - A Tarde R$ 1.496,25, Correio R$ 1.450,00, Tribuna R$ 1.250,00 e dos radialistas R$ 930,00 - dados dos sites dos sindicatos)

Pra comparar, a base para motoristas de ônibus é R$ 1.021, do operário qualificado R$ 718 e do pedreiro R$ 682. E o bóia-fria pode levar R$ 800 pra casa, depois de um duro danado.

Antes que alguém venha berrar que estamos pregando a segregação social ou falar da insalubridade ou periculosidade de algumas das profissões citadas é bom lembrar o que faz um jornalista. Sabendo que todo profissional tem muito valor para a sociedade, os citados neste artigo ou não, vamos falar da nossa praia. O trabalho com a informação que vai chegar a milhões de pessoas é de extrema responsabilidade e exige, pelo menos 17 anos de estudo (até o diploma de graduação). Além disso, a Federação Internacional de Jornalistas afirma que 150 profissionais de mídia foram mortos enquanto trabalhavam em 2005. Nos quatro anos de ocupação no Iraque, por exemplo, são 200 mortos.

Se você acha que Bagdá não é aqui, é bom lembrar que a repórter da Band Nadja Haddad recebeu uma bala de fuzil no abdome enquanto trabalhava no Rio. Tim Lopes foi torturado e morto e Guilherme Portanova foi seqüestrado pelo PCC em São Paulo. Repórteres do Rio hoje saem para trabalhar com colete à prova de balas e, na Bahia, coronel matar profissional de comunicação no interior é cotidiano e banal.

Há também nas redações muitos estagiários fazendo papel de profissional – praga, aliás, que infesta as mais diversas categorias. Quando consegue ser efetivado, dificilmente um repórter de Salvador ganha mais de R$ 1.500 por mês. Mesmo os mais experientes. Os que entram na exceção – e realmente ganham perto daquilo que se imagina por aí que é pago a todos que põe a carinha, bonita ou não, na TV ou o nominho no periódico –, são contratados como Pessoa Jurídica, sem direito trabalhista algum.

Sem querer justificar atitudes dos colegas que acham que ética é uma palavra que só deve ser usada como contraponto naquelas matérias de meter pau em político corrupto, a promiscuidade é grande. São repórteres de esporte donos de passes de atleta, jornalistas da editoria de política que fazem assessoria a deputado no turno oposto ou aqueles que recebem jabá aberto, grana mesmo pra usar a “objetividade jornalística” a favor de alguém. Fato é que, entre os honestos, é preciso procurar mais de um trabalho ou fazer “frila”, trabalhinho free-lance pra não ficar no vermelho no fim do mês.

Profissionais de nível superior e com status social de verdadeiros formadores de opinião, os jornalistas tentam com todas as forças manter a pose, ou pelo menos a dignidade. Convivendo com a crema de la crema é vital sustentar a imagem de que faz parte do extrato social, do topo da pirâmide. Aí entra o lado queixão do jornalista. Sempre em busca do convite, da boca-livre e do brinde. Ou cair pra carteirada mesmo, que cada vez cola menos. Os poderosos já começaram a ver que jornalistas não são tão poderosos assim. São de uma sub-classe.

Se você fica desconfiado de um dentista, médico ou advogado que cobra barato demais pela lógica de que “quando a esmola é demais, o santo desconfia”, porque então acredita piamente nas informações contadas por quem é sub-remunerado? Sei não...

3 comentários:

  1. Parabéns Gabriela, pela coragem de expor a realidade de um mercado com um aparente "glamour" mas na verdade cheio de ilusões e com baixos salários.

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  2. Parabéns pelo texto. Descreveu com exatidão a nossa sofrida realidade de jornalista. Acredito que caberia falar sobre os valores dos "bons" cursos de qualificação exigidos.

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  3. Claro e corajoso, o texto foi revelador de uma realidade que eu não conhecia nem imaginava

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